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sexta-feira, 6 de abril de 2012

Filme redescobre fábrica gaúcha que teria gravado os primeiros sambas e tangos

Do Opera Mundi



Samba e Tango. Símbolos máximos da cultura de Brasil e Argentina, vizinhos separados pela fronteira da língua, mas cujas raízes musicais podem ter um berço comum: uma pequena fábrica de gramofones no Rio Grande do Sul. Na verdade, a Casa Elétrica de Porto Alegre foi a primeira produtora de gramofones da América Latina, no início do século XIX, e funcionou com uma das poucas gravadoras de discos de sua época.
Criada por Savério Leonetti, um imigrante italiano com tino para os negócios e talento musical, a Casa Elétrica se transformou no palco de lançamento de músicos gaúchos que difundiam os ritmos mais populares na época, como valsa, balada e xote.
Até aí, pouco de novidade, não fosse uma polêmica ou, talvez, duas: segundo alguns pesquisadores do tema, como o gaúcho Paixão Cortes, na Casa Elétrica se registrou também o primeiro samba gravado no país, além do primeiro tango argentino gravado em solo latino-americano.
Essa teoria, que vai contra a versão de que o primeiro samba de que se tem registros no Brasil é “Pelo telefone”, gravado por Donga em 1917, é o eixo narrativo do documentário “acasaeletrica.doc”, do cineastao Gustavo Fogaça. O filme, feito em 2011, foi lançado recentemente em um circuito comercial de cinemas de Porto Alegre e, segundo seus produtores, está sendo negociado para exibição em canais nacionais de televisão.
Nascido em Porto Alegre, e tendo vivido vários anos em Buenos Aires, onde estudou cinema e jornalismo, Gustavo conta que sua motivação para realizar o documentário surgiu em um encontro com Geraldo Leonetti, sobrinho-neto do fundador da Casa Elétrica, em 1998. “Ele me contou a história, e fiquei fascinado. Decidimos trabalhar juntos no roteiro, mas infelizmente o Geraldo faleceu. Só em 2005 retomei o projeto, que passou a abarcar também uma ficção, ainda em fase de realização”, conta Gustavo.
O primeiro samba e o primeiro tango
O documentário começa recordando os talentos musicais gaúchos até chegar à importância da Casa Elétrica. Segundo ele, foi lá, em 1913, quatro anos antes de “Por telefone”, que a dupla gaúcha “Os Geraldos”, de Geraldo Magalhães e Nina Teixeira, gravou o samba "Iaiá me diga", composto por Magalhães. Já a gravação do primeiro tango na América Latina aconteceu graças à relação entre Leonetti e o empresário Alfredo Amendola, dono do selo Atlanta, de Buenos Aires.
“O tango surgiu como música bem underground, de bandidos e malandros. Na época, existiam gravadoras de discos em Buenos Aires, mas não uma fábrica. Os artistas gravavam uma matriz, que era mandada à Europa ou aos Estados Unidos para fazer cópias”, explica Gustavo. Com a Primeira Guerra, esse processo foi interrompido, até que Amendola descobriu a Casa Elétrica, onde Francisco Canaro, considerado o primeiro grande mestre de tango, gravou “El chamuyo” em 1914. “A facilidade de gravar os discos em Porto Alegre contribuiu para que o tango deixasse de ser uma música alternativa na Argentina e passasse a ser mainstream”, acrescenta.
Mesmo deixando transbordar em certos momentos um exagerado orgulho regional, “acasaeletrica.doc” levanta questões relevantes, como os laços a serem reatados entre Brasil e a América hispânica e o fim de uma produção cultural descentralizada para privilegiar eixos que passam a dominar a indústria. Além de espalhar a relevante mensagem de que há riquezas de um passado latino-americano comum a serem resgatadas.

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