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quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Livro analisa o processo de criação das grandes reportagens

Dominado por grandes empresas de comunicação - mais interessadas nos lucros do que nas notícias -, o jornalismo brasileiro atravessa uma crise: a apuração, o texto bem escrito e o contato direto com as fontes quase desapareceram. Entretanto, há apenas algumas décadas a profissão era exercida "na raça" e nas ruas, com informações bem costuradas em grandes matérias. E é exatamente isso que Edson Flosi, testemunha e personagem dessa época, mostra em Por trás da notícia - O processo de criação das grandes reportagens (Summus Editorial, 168 p., R$ 51,00). Autor de mais de 500 reportagens assinadas e publicadas em importantes veículos da imprensa, ele apresenta na obra uma amostragem histórica do jornalismo à moda antiga.

Depois de fazer um breve resumo de seu ingresso no jornalismo, o autor, que além de advogado criminalista é professor universitário, oferece ao leitor 15 reportagens selecionadas, que foram publicadas em veículos como Folha de S.Paulo e Jornal da Tarde. Embora tenha se notabilizado pelas reportagens policiais, no livro Flosi oferece também perfis de personalidades e de gente comum, mostrando assim versatilidade e talento para apurar boas histórias.

Os capítulos começam com os bastidores da produção de cada reportagem e apontam ainda eventuais percalços enfrentados pelo autor na época da realização das matérias - boa parte delas escritas durante a ditadura militar de 1964. Em seguida, traz fac-símiles de cada reportagem e depois a reprodução textual destas.
Entre as matérias mais importantes de Flosi estão duas sobre o famoso assalto ao trem pagador, ocorrido em 10 de agosto de 1968. A polícia suspeitava que o assalto havia sido planejado por guerrilheiros que lutavam contra a ditadura.

"Eu queria escrever o que sentia e achava que era a verdade, usando terminologia como guerrilheiros, luta armada, revolucionários, expropriação de fundos para derrubar a ditadura, mas não podíamos fazer isso porque havia recomendação dos órgãos de segurança para usarmos a terminologia que eles impunham, como terrorismo, bandidos, terror, ladrões, assaltantes. Não havia como negar‑se a isso; eram tempos de ditadura", relembra o autor.

Mas foi em novembro de 1968 que Flosi publicou suas reportagens mais conhecidas. Depois de obter uma cópia de um dossiê do Departamento de Ordem Pública e Social (Dops), o repórter escreveu duas matérias que abordavam as ações da guerrilha do Araguaia. Uma delas trazia fotos e curtos perfis de 13 guerrilheiros. "Eu sabia que a documentação era verdadeira. Confiava na fonte e no meu trabalho. É um momento difícil na vida de um repórter: decidir se escreve ou não uma reportagem desse tipo. E nesse momento ele está sozinho; ninguém pode ajudá-lo - a decisão é só dele", recorda Flosi.

O fato é que, fosse investigando crimes ou contando histórias corriqueiras, Flosi legou aos estudantes de jornalismo e a todos os que se interessam pela produção de notícias uma obra inigualável, fruto de uma vida inteira de trabalho. "Não tomei parte no jornalismo ‘empresarial’. Minha carreira acabou antes. Mas, sonhador irreverente, acredito na volta da grande reportagem e do jornalismo literário, o que dependerá das novas gerações de jornalistas, que terão de lutar por mais espaço dentro das empresas se quiserem atingir esse objetivo", conclui.

O autor
Edson Flosi nasceu em São Paulo em 1940. Iniciou-se no jornalismo em 1960 e exerceu a profissão durante 30 anos, passando pelos jornais Folha de S.Paulo, Jornal da Tarde, O Globo e outros órgãos da imprensa. Ocupou quase todos os cargos da Redação: repórter, redator, pauteiro, chefe de reportagem, editor e secretário. Mas, sempre que podia, voltava às ruas para fazer o que mais gostava: reportagem. Em toda a sua carreira foi essencialmente repórter policial. Milita, há 20 anos, no Fórum de São Paulo como advogado criminalista e desde 1996 é professor do curso de jornalismo da Faculdade Cásper Líbero, onde exerce também o cargo de assessor da Diretoria.

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